Congresso Nacional começa a analisar a proposta de Orçamento da União para este ano. O texto enviado pelo Executivo prevê um deficit de R$ 49,6 bilhões nas finanças do governo federal. Já para o produto interno bruto (PIB), a proposta estima um crescimento de 2,51% em relação a 2021. O salário mínimo deve subir para R$ 1.169,00. O texto destina R$ 34,7 bilhões ao programa Auxílio Brasil, que substitui o Bolsa Família.
O resultado primário negativo registrado no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA – PLN 19/2021), de R$ 49,6 bilhões, equivale a 0,5% do PIB, estimado para 2022 em R$ 9,397 trilhões. É uma projeção bem melhor do que a de 1,8%, ou R$ 170,5 bilhões, estabelecida pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO 2022 - Lei 14.194, de 2021).
Segundo as Consultorias de Orçamento do Senado e da Câmara dos Deputados, a diferença entre os resultados primários projetados pela LDO e pelo Orçamento de 2022 decorre principalmente da reestimativa da receita líquida feita pelo governo federal, que foi elevada dos R$ 1,450 trilhão da LDO para R$ 1,593 trilhão no PLOA 2022. O resultado primário é calculado somando todas as receitas e deduzindo todas as despesas, exceto os juros e encargos da dívida. Essa estimativa para o ano seguinte é chamada de meta fiscal.
Como para 2021 está previsto um deficit de R$ 139,4 bilhões (a projeção original do governo era de R$ 155,1 bilhões), ou 1,9% do PIB, pelas contas do Executivo a dívida pública bruta, que estava em 88,8% do PIB em 2020, deverá cair para 81,2% este ano, e para 79,8% em 2022 (com o deficit de R$ 49,6 bilhões). No entanto, a estimativa do mercado, levantada pelo Banco Central (Relatório do Prisma Fiscal), é de um deficit de R$ 100,6 bilhões para 2022, mais que o dobro do projetado pelo Ministério da Economia. Se essa expectativa se confirmar, a queda da dívida será bem menor.
Já o resultado previsto para as estatais federais, exceto Petrobras e Eletrobras, passou de um deficit de R$ 4,4 bilhões, na LDO 2022, para R$ 2,6 bilhões, no PLOA 2022.
Por sua vez, estados e municípios poderão ter um superavit de R$ 2,6 bilhões. Embora o Orçamento da União projete o resultado, apenas as leis orçamentárias de cada um podem estabelecer índices a serem atingidos.
Despesas totais
Dos R$ 4,716 trilhões de despesas estimados para 2022, R$ 1,885 trilhão vai para o refinanciamento da dívida pública, R$ 1,233 trilhão para a Seguridade Social (aposentadorias, assistência social) e R$ 96,5 bilhões serão investidos pelas estatais, restando R$ 1,501 trilhão para as demais despesas. Como as receitas do sistema previdenciário só alcançam 1,063 trilhão, a diferença de R$ 169,9 bilhões será compensada com a arrecadação de impostos e operações de crédito.
Segundo as consultorias do Senado e da Câmara, houve expressiva redução das despesas primárias (total das despesas menos os juros e encargos da dívida pública), estimadas para 2022 em R$ 1,626 trilhão ou 17,5% do PIB. Elas caíram 1,4% em relação ao Orçamento deste ano, principalmente as despesas com pessoal.
Os consultores ressaltam que a despesa caiu sensivelmente se considerado o grande crescimento em 2020, para pagar o combate à pandemia de covid-19. Por outro lado, informam que a despesa para amortização da dívida subirá 13,2% por conta do aumento do valor dos títulos que vencerão no ano que vem.
Teto de gastos
O limite de gastos da União para 2022 é de R$ 1,610 trilhão, que corresponde ao R$ 1,486 trilhão de 2021, corrigido em 8,35% (inflação pelo IPCA – Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Os consultores informam que poderão ser gastos R$ 136,6 bilhões a mais no ano que vem, se somado esse limite com o saldo das despesas não realizadas previsto até o fim de 2021.
Esses recursos deverão pagar o crescimento das despesas com benefícios previdenciários (R$ 52,7 bilhões); sentenças judiciais (R$ 33,7 bilhões); despesas obrigatórias com controle de fluxo (R$ 19 bilhões, sendo R$ 10,7 bilhões para saúde); aporte ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (R$ 13,5 bilhões); despesas com pessoal (R$ 6,6 bilhões); e outras (R$ 5,7 bilhões).
O Executivo poderá gastar até R$ 1,540 trilhão em 2022. Já o Poder Legislativo (Senado, Câmara dos Deputados e Tribunal de Contas da União) terá um limite de R$ 13,91 bilhões e o Judiciário, de R$ 47,88 bilhões. Juntos, o Ministério Público e a Defensoria Pública da União terão outros R$ 7,92 bilhões.
O teto para as despesas públicas foi estabelecido pela Emenda Constitucional 95, que limitou o crescimento dos gastos por 20 anos a partir de 2016.
Mas os consultores do Senado e da Câmara advertem que diversos fatores podem pressionar o teto de gastos em 2022, uma vez que o PLOA não separa recursos suficientes para um aumento maior das despesas previdenciárias, assistenciais e de amparo ao trabalhador por conta das projeções mais recentes para o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) para 2021, que passaram de 6,2% para 8,4% (impacto total de R$ 17,6 bilhões).
Também não há, segundo as consultorias, recursos previstos para aumentar o valor do Auxílio Brasil, como prometido pelo governo (possível impacto de R$ 18,3 bilhões); e para compensar a Previdência Social pela isenção concedida a 17 setores da economia (mais de R$ 8 bilhões).
Educação
O Executivo promete ainda aplicar R$ 111,2 bilhões na manutenção e desenvolvimento do ensino em 2022. Neste ano já foram gastos R$ 100,1 bilhões, informam os consultores.
A complementação da União ao Fundo Nacional da Educação Básica (Fundeb) será de R$ 30,1 bilhões, o que representa um acréscimo de 15% sobre as contribuições de estados e municípios, conforme determina a Constituição.
Com a merenda escolar deverão ser gastos R$ 4 bilhões, para complementar os valores investidos por estados e municípios e atender cerca de 40,2 milhões de estudantes. O fornecimento de livros didáticos deve consumir outros R$ 2,6 bilhões.
Precatórios
O cumprimento de sentenças judiciais, incluindo os precatórios, deve custar R$ 89,1 bilhões à União em 2022, ou 0,9% do PIB. Isso representa um aumento nominal de 78,7% em relação ao pago em 2020 (R$ 49,9 bilhões) e de 60,2% sobre o autorizado para 2021 (R$ 55,6 bilhões). No entanto, na LDO 2022 estão previstos apenas R$ 57,8 bilhões para o pagamento de precatórios.
Tramita no Congresso a PEC 23/2021, que pretende alterar a regra de parcelamento dos precatórios de grande valor prevista na Constituição, alongando os prazos de pagamento de dívidas superiores a R$ 66 milhões. A ideia foi criticada por vários economistas, que classificaram a medida como um calote. O governo conta com essa solução ou com uma negociação capitaneada pelo Conselho Nacional de Justiça para não estourar o teto de gastos.
Segundo as consultorias do Senado e da Câmara, o crescimento no volume de precatórios ocorreu em todos os ramos do Judiciário, destacando-se as sentenças relativas ao Fundef, do Supremo Tribunal Federal (STF), que beneficiam vários estados. Em 2010 as despesas com sentenças judiciais correspondiam a apenas 11% das despesas primárias discricionárias, no ano passado alcançaram 46% e no ano que vem devem chegar a 90%.
Assistência social
Para o Auxílio Brasil, programa criado pelo governo para substituir o Bolsa Família, o PLOA 2022 prevê R$ 34,7 bilhões para atender 14,7 milhões de famílias, praticamente o mesmo valor previsto para 2021. Os consultores ressaltam que, diferentemente do Bolsa Família, os recursos do Auxílio Brasil não estão regionalizados no projeto.
Já o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a Renda Mensal Vitalícia, que pagam um salário mínimo aos idosos e às pessoas com deficiência pobres, consumirão outros R$ 73,47 bilhões. No PLOA não está previsto o pagamento de auxílio emergencial em 2022.
Fundos eleitoral e partidário
A despesa com o fundo eleitoral para as eleições de 2022 está projetada em R$ 2,13 bilhões, 4,5% superior aos R$ 2 bilhões autorizados para 2020. Desses recursos, R$ 1,316 bilhão vem da redução do valor das emendas impositivas de bancada (veja mais abaixo em "Emendas parlamentares"). A parcela restante, de R$ 812 milhões, corresponde à compensação fiscal que as emissoras de rádio e TV receberam pela propaganda partidária de 2016 e 2017.
Se o governo tivesse usado o limite permitido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, aprovada pelo Congresso Nacional em julho, o fundo eleitoral poderia passar de R$ 5,7 bilhões. Mas esse valor foi vetado em agosto.
Já para o fundo partidário, foi destinado R$ 1,06 bilhão, o que corresponde aos R$ 979,4 milhões de 2021 corrigidos pelo IPCA.
Censo 2022
Outra despesa prevista para 2022 é a realização do censo demográfico, no valor de R$ 2 bilhões. Um crédito adicional de R$ 82,3 milhões já foi destinado ao pagamento das despesas de preparação a serem realizadas este ano e outro de R$ 35,7 milhões aguarda aprovação pelo Congresso.
O pequeno valor autorizado em 2021 (R$ 135,5 milhões) levou o IBGE a reprogramar a realização do censo para 2022. Em abril deste ano, no entanto, o então ministro do STF Marco Aurélio Mello concedeu liminar para obrigar a execução do censo ainda em 2021. Mas o Supremo decidiu que, por conta da pandemia de covid-19, o censo poderia ser feito em 2022, com os trabalhos de preparação começando ainda neste ano.
Investimentos
De acordo com as consultorias de Senado e Câmara, uma das grandes mudanças entre o Orçamento deste ano e o de 2022 é a queda nos recursos para investimento pelas estatais, de 33,1% em valores nominais. Serão R$ 96,5 bilhões, frente a R$ 144,3 bilhões no Orçamento de 2021. Foram reservados ainda R$ 25,7 bilhões para investimento direto, praticamente o mesmo patamar do PLOA 2021 (R$ 25,9 bilhões).
Eles lembram, no entanto, que as emendas parlamentares sempre aumentam a verba para investimento.
Emendas parlamentares
Outro item de despesa do Orçamento 2021 são as emendas impositivas, no valor de R$ 16,2 bilhões, destinadas obrigatoriamente a atender as indicações de gastos feitas por parlamentares. Em 2021 o valor das emendas foi de R$ 16,3 bilhões.
Serão R$ 10,5 bilhões para emendas individuais, o que dá cerca de R$ 17,6 milhões para cada um dos 594 parlamentares (513 deputados mais 81 senadores), divididos em até 25 emendas.
Já das emendas de bancada estadual (o conjunto de deputados e senadores de um estado), que, pela Constituição, teriam de ser de R$ 7 bilhões a partir de 2022, foram descontados R$ 1,3 bilhão, destinados pela LDO 2022 ao fundo eleitoral.
Despesas não obrigatórias
As despesas não obrigatórias somam R$ 98,6 bilhões no Orçamento para 2022, uma redução de R$ 500 milhões em relação a 2021. Elas passarão de 7,3% das despesas totais em 2021 para 6% em 2022.
Receitas somam R$ 4.619,67 trilhões
O texto enviado pelo Executivo prevê uma receita bruta de R$ 4,619 trilhões, o equivalente a 49% do PIB, um acréscimo de R$ 390,76 bilhões em relação ao previsto para 2021. Outros R$ 96,5 bilhões virão das estatais.
A estimativa para a receita primária bruta no PLOA 2022 é de R$ 1,959 trilhão, o que representa crescimento de R$ 142,5 bilhões, ou 7,8%, em relação às últimas estimativas para 2021. Esse percentual é superior à média de 3,4% de crescimento da arrecadação no período 2014- 2020 e à projeção de 3,5% para o IPCA.
A receita líquida deve ficar em R$ 1,597 trilhão, ou 17% do PIB, um aumento de 8,2% em relação ao previsto para este ano. A receita líquida é calculada como a receita bruta menos as transferências obrigatórias para estados e municípios, estimada em R$ 361,8 bilhões em 2022. Faz parte desse montante a transferência de R$ 4 bilhões para compensar as perdas com o ICMS sobre as exportações definida pela Lei Complementar 176, de 2021, que obrigou a União a repassar aos estados e municípios, no período de 2020 a 2037, R$ 58 bilhões.
Outra fonte de receita, as financeiras, que englobam o refinanciamento da dívida, operações de crédito e a aplicação dos recursos do Tesouro, devem totalizar R$ 2,661 trilhões. Por outro lado, a proposta do Executivo para 2022 não inclui receitas de possíveis privatizações, como a da Eletrobras.
Reforma tributária
Essas estimativas de arrecadação do governo federal foram feitas dando como certa a aprovação do PL 2.337/2021, que faz uma reforma tributária. O projeto modifica a cobrança do Imposto de Renda, tanto para pessoas físicas quanto para empresas; altera a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); taxa fundos de investimentos e lucros e dividendos distribuídos pelas empresas; e permite a atualização dos valores dos imóveis na Receita Federal desde que pago 4% de IR sobre o ganho de capital.
Renúncia fiscal
Para 2022, estima-se que o governo deixará de arrecadar R$ 371,1 bilhões, ou 3,95% do PIB, com as isenções fiscais concedidas. Embora inferior aos 4,3% e 4,0% dos PLOAs para 2020 e 2021, respectivamente, esse percentual ainda está distante dos 2% do PIB a serem alcançados daqui a oito anos, como determina a Constituição.
A Região Sudeste recebe a maior parcela dos benefícios tributários, com R$ 171,1 bilhões (46,1%). A Região Norte receberá 16,2%; o Sul, 15,4%; o Nordeste, 12,2%; e o Centro-Oeste, 10,2%.
Com os benefícios financeiros e de crédito concedidos, estima-se que o governo gastará outros R$ 71,2 bilhões em 2022, o que representa aumento de 10,7% em relação aos R$ 64,3 bilhões previstos para 2021.
Indicadores econômicos
Pelo projeto, o salário mínimo para 2022 será de R$ 1.169, recebendo correção apenas pela inflação (pelo INPC), sem aumento real. O mínimo atual é R$ 1.100.
O PLOA estima ainda a cotação média do dólar americano para 2022 em R$ 5,15 e a inflação, em 3,5% (IPCA). Já a taxa de juros básica da economia, a Selic, embora prevista em 6,63% no documento, deve terminar o ano em 7,5% segundo as estimativas de mercado.
Para os consultores do Congresso, se confirmadas as expectativas do mercado para a inflação, principalmente para a de 2021, as despesas previdenciárias e assistenciais crescerão além do previsto no PLOA. Eles ressaltam ainda que o novo salário mínimo não contempla a defasagem de R$ 2 causada pelo fato de a inflação de 2021 ter sido mais alta do que a prevista no Orçamento do ano passado.
É comum o Executivo enviar ajustes ao PLOA ao longo da tramitação do projeto no Congresso.
As consultorias alertam ainda que os efeitos econômicos da pandemia de covid-19, que provocaram grave recessão em 2020, com redução de 4,1% no PIB, continuarão produzindo impactos em 2021 e influenciando as projeções sobre a economia de 2022 a 2024.
Obras bloqueadas
Por último, o PLOA 2022 lista quatro obras com irregularidades graves que não poderão receber recursos, a menos que os problemas sejam resolvidos: o Canal Adutor do Sertão Alagoano (AL); a adequação de trecho da BR-116 (BA); a construção da BR-040 (RJ); e a ampliação de capacidade da BR-290 (RS).
Tramitação
Pela Constituição, o Orçamento da União para 2022 deve ser aprovado até 22 de dezembro. Depois de recebido o projeto, ele é analisado pela Comissão Mista de Orçamento (CMO), onde é debatido em audiências públicas e recebe emendas de senadores e deputados. Em seguida é apresentado e votado um relatório exclusivo para as receitas. O próximo passo é a votação de um relatório preliminar, que estabelece os parâmetros e critérios para os relatórios setoriais e para a apresentação de emendas durante a tramitação.
Seguem-se a apresentação e a votação dos relatórios setoriais, em que as despesas por área de atuação do governo são discutidas. Por último, a Comissão Mista de Orçamento avalia um relatório geral, com receitas e despesas, que é levado em seguida ao Plenário do Congresso. Aprovado, o PLOA volta ao Executivo. Caso haja vetos do presidente da República, eles retornam ao Congresso para votação.
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